Bom, eu nem sei por onde começar para que vocês me entendam. Tenho 27 anos e, desde pequeno, eu quis ser um super-herói, alguém capaz de tornar o mundo um lugar menos ruim. O que aconteceu comigo, porém, seguiu um caminho diferente e, para muita gente, eu acabei ficando do lado errado da briga.

Meu interesse por computadores começou cedo, pelo menos para a realidade em que eu vivia. Aos 12 anos, eu já tinha um computador mediano, e foi ali que meu aprendizado começou de verdade. Não era só curiosidade superficial; eu passava horas estudando, testando, errando e aprendendo sozinho.

Aos 16, eu já programava com segurança. Aos 21, eu tinha uma formação sólida em informática, programação, engenharia de software, criptografia, gestão de dados e desenvolvimento web. Eu tinha capacidade técnica para seguir um caminho convencional, trabalhar em empresas ou seguir carreira formal, mas escolhi outra coisa. Segui a curiosidade, o anonimato e a sensação de propósito que encontrei no hacking.

Passei a frequentar fóruns na deep web, participar de grupos fechados e trocar conhecimento com pessoas que tinham interesses parecidos com os meus. Com o tempo, criei meu próprio fórum. Ele não era público, nem aberto a qualquer um. Era um espaço privado, voltado apenas para pessoas próximas e de confiança. Ali, eu e meus camaradas compartilhávamos descobertas, aprendizados e, em alguns casos, trabalhávamos juntos em ataques coordenados.

Eu não me coloco como santo. Tenho plena consciência do que fiz. Ainda assim, na minha cabeça, existia um critério: as pessoas atingidas eram indivíduos envolvidos com pedofilia, misoginia extrema, ideologias de superioridade, golpes e outros tipos de crimes e abusos. Eu acreditava talvez ingenuamente que estava fazendo algo justificável.

Com o tempo, as coisas começaram a sair do controle. Cerca de um ano atrás, uma ação coordenada entre membros do fórum resultou no acesso a arquivos sigilosos do governo dos Estados Unidos e a uma lista de cartões de crédito ligados a políticos com histórico duvidoso. Um mês depois disso, o fórum foi derrubado.

Foi aí que o desespero começou. Eu não sabia o que realmente tinha acontecido, nem até onde aquilo poderia chegar. Peguei todo o dinheiro que eu tinha, vendi alguns bens, mudei de lugar e me desfiz dos equipamentos que usava na época. Eles não continham informações pessoais, mas, naquele momento, eu não queria correr risco algum.

Desde então, eu tenho me afastado desse mundo. Mesmo assim, a sensação não passa. Eu vivo em estado de alerta constante. Me sinto seguido, observado, mesmo sem ter provas concretas disso. Um dos meus colegas daquela época, inclusive, supostamente cometeu suicídio, o que só aumentou minha paranoia e meu medo.

O que mais me assombra é saber que quem fechou o fórum foi a Polícia Federal. Se eu for identificado, preso e extraditado considerando que os crimes envolveram os EUA é muito provável que eu nunca mais saia do interior de uma cela. Eu sabia o que estava fazendo, mas não sabia o peso psicológico que isso teria depois. Não imaginava como seria viver com a sensação constante de estar sendo caçado, sem sequer ter certeza se isso é real ou não.